A VERDADE DO EVANGELHO
TEOLOGIA SISTEMÁTICA

Charles Finney

 

AULA 32

A SOBERANIA DIVINA

 

Discutindo esta matéria, me empenharei para mostrar, O que o termo "soberania" não significa quando é aplicado a Deus.

Quando se aplica este termo a Deus, ao menos em minha opinião, em qualquer instância, não se entende que Ele agirá ou deseja agir arbitrariamente, ou sem boas razões; razões tão boas ou de tal peso, que Ele absolutamente não pudesse agir de outro modo diferente daquele que Ele age, sem violar a lei de sua própria inteligência e consciência, e consequentemente sem pecado. Qualquer visão da divina soberania, que implique em arbitrariedade por parte da divina vontade, não é somente contrária às Escrituras, mas também é uma revolta para com a razão, e é blasfema. Deus não pode agir arbitrariamente, no sentido insensato, sem infinita maldade. Para que Ele fosse arbitrário, no sentido insensato, seria uma maldade muito maior do que qualquer criatura seria capaz de comprometer-se, assim como a sua razão ou conhecimento é maior do que a deles. Este fato deve ser por si só, evidente. Deus jamais deveria ser, portanto, representado como um soberano, no sentido que implica em que Ele atuasse por si mesmo ou de modo arbitrário, ao invés de agir por sua infinita inteligência.

Para mim, muitos parecem representar a soberania de Deus como consistindo em uma perfeita disposição arbitrária de eventos. Eles parecem ter Deus em uma concepção completamente superior, e sem qualquer lei ou regra de ação que dirigisse a sua vontade por sua infinita razão e consciência. Eles se mostram chocados pela idéia do próprio Deus estar sujeito à lei moral, estando prontos a inquirir: "Quem é que deu a lei a Deus?". Parece que jamais consideraram que Deus é, e deve ser, a lei para consigo mesmo; que Ele é necessariamente onisciente, e que a divina razão deve obrigatoriamente impor a lei, ou prescrever a lei para a disposição divina. Parecem considerar a Deus como alguém que vive completamente acima da lei, e disposto a ter cumprida a sua vontade a qualquer custo, seja isto razoável ou não; alguém que deseja que o seu prazer arbitrário seja cumprido como sua única regra de ação, e que impõe o seu juízo acima de todos os seus assuntos. Esta soberania que parecem conceber, como que dispondo e controlando todos os eventos, com uma fatalidade de ferro, ou adamantina, inflexível, irresistível, ou onipotente. "Conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" (Ef 1.11).

Este é o texto em que muitos se baseiam, para ensinar que Deus dispõe todos os eventos de forma absoluta, e não de acordo com a sua própria e infinita sabedoria e discrição, mas simplesmente de acordo com a sua própria vontade; e, a linguagem destes parece freqüentemente implicar em que, tudo se passe sem qualquer referência à lei universal da benevolência. Não direi que esta é a visão que repousa na própria mente destas pessoas; mas somente que, pela linguagem que utilizam, tal pareceria ser a idéia destes quanto à divina soberania. Esta não é, contudo, a visão sobre este tema que enunciarei e defenderei nesta presente ocasião.

 

O que se deseja transmitir através dos termos "soberania divina".

A soberania de Deus consiste na independência de sua vontade, em consultar a sua própria inteligência e discrição, na seleção de sua finalidade, e nos meios para realizá-la. Em outras palavras, a soberania de Deus não é nada mais do que a sua infinita benevolência dirigida por seu infinito conhecimento. Deus não consulta a ninguém a respeito daquilo que deve ser feito por Ele. Ele não pede licença para fazer e requerer aquilo que dita a sua vontade. Deus somente consulta a Si mesmo; isto é, à sua infinita inteligência. Ele está muito distante de ser arbitrário em sua soberania, no sentido de não ser razoável, pois é invariavelmente dirigido por sua infinita razão. Ele somente consulta a sua própria inteligência, não a partir de qualquer disposição arbitrária, mas por ser o seu conhecimento perfeito e infinito, sendo, portanto, mais seguro e sábio do que tomar conselho em qualquer outro lugar. Seria completamente não razoável, e fraco, e haveria maldade, se Deus pedisse licença a qualquer ser para agir em conformidade com o seu próprio juízo. Ele deve fazer de seu próprio entendimento, a sua regra de ação. Deus é soberano, não no sentido de que não esteja debaixo da lei, ou que esteja acima de toda lei, mas no sentido de que Ele é a lei para Si mesmo; que Ele não conhece outra lei além daquela que Lhe é dada por sua própria razão. Ainda em outras palavras, a soberania de Deus consiste em uma tal disposição de todas as coisas e eventos, para que se vá de encontro às idéias de sua própria razão, às demandas de sua própria inteligência. "Daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" (Ef 1.11), no sentido de que Ele formou e executa os seus próprios desígnios de modo independente; no sentido de que Ele consulta a sua própria e infinita discrição; isto é, Ele age de acordo com a sua própria visão daquilo que é próprio e adequado. Isto Ele faz, e que seja compreendido distintamente, sem de modo algum colocar de lado a liberdade moral daqueles que estão envolvidos em cada caso. O seu infinito conhecimento o capacitou a selecionar tanto o fim como os meios, que devem ser consistentes com a perfeita liberdade dos agentes morais e devem ainda incluí-los. Os sujeitos de seu governo moral estão livres para obedecer ou para desobedecer, e arcar com as conseqüências. Antevendo, porém, precisamente, em todos os casos, como eles agiriam, Deus estabeleceu o seu plano de modo adequado para que pudesse trazer os resultados contemplados e desejados. Em todos os seus planos jamais consultou a alguém, exceto a si mesmo. Porém isto leva-me a dizer que:

 

 

Deus é, e deve ser, um soberano absoluto e universal.

Quero dizer, de modo absoluto, que esta vontade expressa em obediência à sua razão, é lei. Não é lei por proceder de sua vontade arbitrária, mas por ser a revelação ou a declaração das afirmações e demandas de sua infinita razão. A sua vontade expressa é lei, por ser uma infalível declaração daquilo que é intrinsecamente adequado, próprio, ou correto. A vontade dEle não é o que executa as suas ordens, direito, adequação, aquilo que é próprio, o que é obrigatório, no sentido de que Ele o requeira. O oposto daquilo que Ele agora requer seria devido, próprio, adequado, obrigatório; porém no sentido de que não precisamos de qualquer outra evidência daquilo que é intrinsecamente próprio, adequado, ou obrigatório além da expressão da sua vontade. A nossa razão afirma que a vontade dEle é a correta; não por Ele querer, mas porque se Ele o quer é porque esta é a opção correta, ou obrigatória pela natureza das coisas; isto é, a nossa razão afirma que Ele deseja algo, somente sobre uma condição que é aquela afirmada por sua infinita inteligência, de que tal desejo é intrinsecamente correto, e portanto Ele deve querer ou ordenar somente aquilo que Ele quer ou ordena.

Ele é soberano no mesmo sentido de que a sua vontade é lei, sejamos nós capazes ou não de enxergarmos a razão de seus mandamentos, porque a nossa razão afirma que Ele tem e deve ter boas e suficientes razões para cada mandamento; tão boas e suficientes, que não poderia fazer algo diferente do que requerer aquilo que Ele requer, sob as circunstâncias, sem violar a lei de sua própria inteligência. Portanto não precisamos de outra razão para afirmar a nossa obrigação de desejar e fazer, do que a razão de este ser um requisito de Deus; porque sempre, e necessariamente assumimos que aquilo que Deus requer deve ser obrigatoriamente correto, não porque Ele arbitrariamente o queira, mas pelo fato de Ele não o querer arbitrariamente: pelo contrário, Ele tem e deve sempre ter em cada situação, infinitamente boas e sábias razões para cada ordem.

Algumas pessoas representam a Deus como um soberano, no sentido de que a sua vontade arbitrária seja o fundamento da obrigação. Mas se isto fosse assim, Ele poderia em cada situação exigir diretamente, exatamente o oposto daquilo que Ele agora exige, obrigatoriamente. Mas isto é absurdo. As pessoas mencionadas parecem pensar que, a menos que seja admitido que a vontade de Deus seja o fundamento da obrigação, seguir-se-á que este fato não impõe nenhuma obrigação, a menos que Ele torne públicas as razões para os seus requisitos. Porém este é um grande erro. A nossa própria razão afirma que a expressa vontade de Deus é sempre lei, no mesmo sentido de que ela invariavelmente declara a lei da natureza, ou torna públicas as decisões de sua própria razão.

Deus deve obrigatoriamente ser um soberano absoluto no sentido definido há pouco. Este fato se tornará evidente se considerarmos:

1. O final foi decidido e então os meios foram escolhidos com base neste final, quando nenhum ser existia além dEle mesmo, e é claro, não havia ninguém a consultar exceto a Ele mesmo.

2. A criação e a providência são somente resultados, e o veículo de seus planos que foram estabelecidos desde a eternidade.

3. A lei da benevolência, assim como existia na Divina razão, deve ter eternamente demandado dEle que o caminho escolhido fosse exatamente aquele que Ele escolheu.

4. A maior e mais alta glória, assim como o maior e mais alto bem da criação universal, demandaram que Ele consultasse a sua própria discrição, e exercitasse uma soberania universal e absoluta, no sentido já explicado. A infinita sabedoria e bondade deveriam, sem dúvida, agir de modo independente para a promoção de seu final determinado. Se a infinita sabedoria ou conhecimento não têm a finalidade de dar a lei, o que ou quem a dará? Se a infinita benevolência não declarará ou não fará com que a lei seja cumprida, o que ou quem o fará? Os atributos e relações de Deus conduzem-no obrigatoriamente a exercer exatamente aquela santa soberania que a Ele atribuímos.

(1) Ele, e não outro, reivindica para Si mesmo tal soberania. "Mas o nosso Deus está nos céus e faz tudo o que lhe apraz" (SI 115.3).

"Tudo o que o Senhor quis, ele o fez, nos céus e na terra, nos mares e em todos os abismos" (SI 135.6).

"Porque, assim como descem a chuva e a neve dos céus e para lá não tornam, mas regam a terra e a fazem produzir, e brotar, e dar semente ao semeador, e pão ao que come, assim será a palavra que sair da minha boca; ela não voltará para mim vazia; antes, fará o que me apraz e prosperará naquilo para que a enviei" (Is 55.10-11).

"Naquele tempo, respondendo Jesus, disse: Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim te aprouve" (Mt 11.25-26).

"Pois diz a Moisés: Compadecer-me-ei de quem me compadecer e terei misericórdia de quem eu tiver misericórdia. Assim, pois, isto não depende do que quer, nem do que corre, mas de Deus, que se compadece. Porque diz a Escritura a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para em ti mostrar o meu poder e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra. Logo, pois, compadece-se de quem quer e endurece a quem quer" (Rm 9.15-18).

"Nele, digo, em quem também fomos feitos herança, havendo sido predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" (Ef 1.11).

(2) Novamente: Deus reivindica para si mesmo todas as prerrogativas de um absoluto e universal soberano, no mesmo sentido já explicado. Por exemplo, Ele reivindica ser o legítimo e único proprietário do universo.

"Tua é, Senhor, a magnificência, e o poder, e a honra, e a vitória, e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu é, Senhor, o reino, e tu te exaltaste sobre todos como chefe" (1 Cr 29.11).

"Porque meu é todo animal da selva e as alimárias sobre milhares de montanhas. Conheço todas as aves dos montes; e minhas são todas as feras do campo. Se eu tivesse fome, não to diria, pois meu é o mundo e a sua plenitude" (SI 50.10-12).

"Seu é o mar, pois ele o fez, e as suas mãos formaram a terra seca. O, vinde, adoremos e prostremo-nos! Ajoelhemos diante do Senhor que nos criou. Porque ele é o nosso Deus, e nós, povo do seu pasto e ovelhas da sua mão" (Sl 95.5-7).

"Sabei que o Senhor é Deus; foi ele, e não nós, que nos fez povo seu e ovelhas do seu pasto" (SI 100.3).

"Eis que todas as almas são minhas; como a alma do pai, também a alma do filho é minha; a alma que pecar, essa morrerá" (Ez 18.4).

"Porque, se vivemos, para o Senhor vivemos; se morremos, para o Senhor morremos. De sorte que, ou vivamos ou morramos, somos do Senhor" (Rm 14.8).

(3) Novamente: Deus reivindica ter estabelecido todas as leis físicas ou naturais do universo.

"A tua fidelidade estende-se de geração a geração; tu firmaste a terra, e firme permanece. Conforme o que ordenaste, tudo se mantém até hoje; porque todas as coisas te obedecem" (SI 119.90-91).

"O Senhor, com sabedoria, fundou a terra; preparou os céus com inteligência. Pelo seu conhecimento, se fenderam os abismos, e as nuvens destilam o orvalho" (Pv 3.19-20).

"Assim diz o Senhor, que dá o sol para luz do dia e as ordenanças da lua e das estrelas para luz da noite, que fende o mar e faz bramir as suas ondas; Senhor dos Exércitos é o seu nome" (Jr 31.35).

"Assim diz o Senhor: Se o meu concerto do dia e da noite não permanecer, e eu não puser as ordenanças dos céus e da terra, também rejeitarei a descendência de Jacó e de Davi, meu servo, de modo que não tome da sua semente quem domine sobre a semente de Abraão, Isaque e Jacó; porque removerei o seu cativeiro e apiedar-me-ei deles" (Jr 33.25-26).

(4) Deus reivindica o direito de exercer a suprema autoridade.

"Tua é, Senhor, a magnificência, e o poder, e a honra, e a vitória, e a majestade; porque teu é tudo quanto há nos céus e na terra; teu é, Senhor, o reino, e tu te exaltaste sobre todos como chefe" (1 Cr 29.11).

"Pois Deus é o Rei de toda a terra; cantai louvores com inteligência" (SI 47.7).

"Porque o Senhor é o nosso Juiz; o Senhor é o nosso Legislador; o Senhor é o nosso Rei; ele nos salvará" (Is 33.22).

(5) Deus reivindica o direito de exercer a sua própria discrição no uso de tais meios, e exercê-lo de acordo com a sua vontade de modo a assegurar a regeneração da espécie humana, ou não, como lhe parecer mais sábio.

"Porém não vos tem dado o Senhor um coração para entender, nem olhos para ver, nem ouvidos para ouvir, até ao dia de hoje" (Dt 29.4).

"Portanto, assim diz o Senhor, o Deus dos Exércitos: Porquanto disseste tal palavra, eis que converterei as minhas palavras na tua boca em fogo, e a este povo, em lenha, e eles serão consumidos" (Jr 5.14).

"E, acercando-se dele os discípulos, disseram-lhe: Por que lhes falas por parábolas? Ele, respondendo, disse-lhes: Porque a vós é dado conhecer os mistérios do Reino dos céus, mas a eles não lhes é dado" (Mt 13.10-11).

"E que direis se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita paciência os vasos da ira, preparados para perdição, para que também desse a conhecer as riquezas da sua glória nos vasos de misericórdia, que para glória já dantes preparou" (Rm 9.22-23).

"Instruindo com mansidão os que resistem, a ver se, porventura, Deus lhes dará arrependimento para conhecerem a verdade" (2 Tm 2.25).

(6) Deus reivindica o direito de permitir que as suas criaturas sejam provadas pela tentação.

"Quando profeta ou sonhador de sonhos se levantar no meio de ti e te der um sinal ou prodígio, e suceder o tal sinal ou prodígio, de que te houver falado, dizendo: Vamos após outros deuses, que não conheceste, e sirvamo-los, não ouvirás as palavras daquele profeta ou sonhador de sonhos, porquanto o Senhor, vosso Deus, vos prova, para saber se amais o Senhor, vosso Deus, com todo o vosso coração e com toda a vossa alma" (Dt 13.1-3).

"E disse o Senhor: Quem induzirá Acabe, a que suba e caia em Ramote-Gileade? E um dizia desta maneira, e outro, de outra.

Então, saiu um espírito, e se apresentou diante do Senhor e disse: Eu o induzirei. E o Senhor lhe disse: Com quê?

E disse ele: Eu sairei e serei um espírito da mentira na boca de todos os seus profetas. E ele disse: Tu o induzirás e ainda prevalecerás; sai e faze assim" (1 Rs 22.20-22).

"E disse o Senhor a Satanás: Observaste o meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele, homem sincero e reto, temente a Deus, desviando-se do mal, e que ainda retém a sua sinceridade, havendo-me tu incitado contra ele, para o consumir sem causa. Então, saiu Satanás da presença do Senhor e feriu a Jó de uma chaga maligna, desde a planta do pé até ao alto da cabeça" (Jó 2.3,7).

"Então, foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo" (Mt 4.1).

(7) Deus também reivindica o direito de utilizar todas as criaturas, e de dispor de todas as criaturas e eventos para cumprir os seus próprios planos.

"Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens e com açoites de filhos de homens" (2 Sm 7.14).

"E Naamã, chefe do exército do rei da Síria, era um grande homem diante do seu senhor e de muito respeito; porque por ele o Senhor dera livramento aos sírios; e era este varão homem valoroso, porém leproso" (2 Rs 5.1).

"E eis que deram sobre eles os sabeus, e os tomaram, e aos moços feriram ao fio da espada; e eu somente escapei, para te trazer a nova.

Estando ainda este falando, veio outro e disse: Ordenando os caldeus três bandos, deram sobre os camelos, e os tomaram, e aos moços feriram ao fio da espada; e só eu escapei, para te trazer a nova.

E disse: Nu saí do ventre de minha mãe e nu tornarei para lá; o Senhor o deu e o Senhor o tomou; bendito seja o nome do Senhor " (Jó 1.15,17,21).

"Ai da Assíria, a vara da minha ira! Porque a minha indignação é como bordão nas suas mãos. Enviá-la-ei contra uma nação hipócrita e contra o povo do meu furor lhe darei ordem, para que lhe roube a presa, e lhe tome o despojo, e o ponha para ser pisado aos pés, como a lama das ruas, ainda que ele não cuide assim, nem o seu coração assim o imagine; antes, no seu coração, intenta destruir e desarraigar não poucas nações. Por isso, acontecerá que, havendo o Senhor acabado toda a sua obra no monte Sião e em Jerusalém, então, visitarei o fruto do arrogante coração do rei da Assíria e a pompa da altivez dos seus olhos. Porventura, gloriar-se-á o machado contra o que corta com ele? Ou presumirá a serra contra o que puxa por ela? Como se o bordão movesse aos que o levantam ou a vara levantasse o que não é um pedaço de madeira!" (Is 10.5-7,12,15).

"E exercerei a minha vingança sobre Edom, pela mão do meu povo de Israel; este fará em Edom segundo a minha ira e segundo o meu furor; e os edomitas conhecerão a minha vingança, diz o Senhor Jeová" (Ez 25.14).

"Porque eis que suscito os caldeus, nação amarga e apressada, que marcha sobre a largura da terra, para possuir moradas não suas. Não és tu desde sempre, ó Senhor meu Deus, meu Santo? Nós não morreremos. Ó Senhor, para juízo o puseste, e tu, ó Rocha, o fundaste para castigar" (He 1.6,12).

(8) Deus reivindica o direito de tirar a vida de suas criaturas pecaminosas, conforme o seu próprio critério.

"E disse: Toma agora o teu filho, o teu único filho, Isaque, a quem amas, e vai-te à terra de Moriá; e oferece-o ali em holocausto sobre uma das montanhas, que eu te direi" (Gn 22.2).

"Porém, das cidades destas nações, que o Senhor, teu Deus, te dá em herança, nenhuma coisa que tem fôlego deixarás com vida. Antes, destruí-las-ás totalmente: aos heteus, e aos amorreus, e aos cananeus, e aos ferezeus, e aos heveus, e aos jebuseus, como te ordenou o Senhor, teu Deus, para que vos não ensinem a fazer conforme todas as suas abominações, que fizeram a seus deuses, e pequeis contra o Senhor, vosso Deus" (Dt 20.16-18).

"Vai, pois, agora, e fere a Amaleque, e destrói totalmente tudo o que tiver, e não lhe perdoes; porém matarás desde o homem até à mulher, desde os meninos até aos de peito, desde os bois até às ovelhas e desde os camelos até aos jumentos" (1 Sm 15.3).

(9) Deus declara que deseja, e manterá a sua própria soberania.

"Eu sou o Senhor; este é o meu nome; a minha glória, pois, a outrem não darei, nem o meu louvor, às imagens de escultura" (Is 42.8).

"Por amor de mim, por amor de mim, o farei, porque como seria profanado o meu nome? E a minha glória não a darei a outrem" (Is 48.11).

Estas passagens revelam o teor geral das Escrituras a respeito deste tema.

 

Observações finais

1. A soberania de Deus é infinitamente amável, doce, santa, e uma soberania desejável. Parece que alguns a entendem como se ela fosse revoltante e tirânica. Porém ela é infinitamente oposta a isto, sendo a perfeição de tudo o que é razoável, gentil e bom.

"Porque assim diz o Alto e o Sublime, que habita na eternidade e cujo nome é Santo: Em um alto e santo lugar habito e também com o contrito e abatido de espírito, para vivificar o espírito dos abatidos e para vivificar o coração dos contritos. Porque para sempre não contenderei, nem continuamente me indignarei; porque o espírito perante a minha face se enfraqueceria, e as almas que eu fiz. Pela iniqüidade da sua avareza, me indignei e os feri; escondi-me e indignei-me; mas, rebeldes, seguiram o caminho do seu coração. Eu vejo os seus caminhos e os sararei; também os guiarei e lhes tornarei a dar consolações e aos seus pranteadores. Eu crio os frutos dos lábios: paz, paz, para os que estão longe e para os que estão perto, diz o Senhor, e eu os sararei" (Is 57.15-19).

2. Muitos parecem ter medo de pensar, ou de falar a respeito da soberania de Deus, e até mesmo ignorá-la, através de uma leitura muito superficial das passagens das Escrituras que tão completamente a declaram. Pensam que não é prudente ou que é perigoso pregar sobre este tema, exceto quando a ocasião for propícia para negar ou reduzir a soberania de Deus através de uma explicação errônea. Este temor, em mentes pias, foi sem dúvida originado por uma concepção errônea sobre a natureza de sua soberania. Estas pessoas foram conduzidas por falsos ensinamentos, ou de alguma forma foram levadas a compreender a Divina soberania como um despotismo de ferro, imutável. Ou seja, estas pessoas erroneamente entenderam que a doutrina da soberania representa Deus. Elas portanto a temem e a rejeitam. Porém seja lembrado e para sempre compreendido, para eterna felicidade e inefável consolação de todos os seres santificados, que a soberania de Deus não é nada mais do que amor infinito dirigido pelo conhecimento infinito; e estes em uma tal disposição de eventos que assegurem o mais alto bem estar do universo. De modo que quanto à totalidade dos detalhes da criação, da providência e da graça, não exista sequer uma medida solitária dEle, que não seja infinitamente sábia e boa.

3. O correto entendimento da universal ação e soberania de Deus, da perfeita sabedoria e benevolência de cada detalhe de seu governo, no sentido providencial e moral, é essencial para o melhor desenvolvimento de todas as suas dispensações para conosco, e para aqueles que estão à nossa volta. Quando as pessoas compreendem que a mão de Deus está direta ou indiretamente em tudo aquilo que acontece, e que Ele é infinitamente sábio e bom, e igualmente sábio e bom em cada dispensação em particular -- que Ele tem sempre em vista uma finalidade, de modo firme -- e que Ele sempre age em benefício de uma e sempre da mesma suprema finalidade -- e que este fim é o mais alto bem tanto para Ele mesmo como para os seres no universo; e digo que quando este fato é entendido e considerado, existe uma divina doçura em todas as suas dispensações. Existe, então, uma justificativa Divina, bem como uma amabilidade e bondade, que é lançada sobre as pessoas como um amplo manto de infinito amor sobre todo o seu caráter, trabalhos e caminhos. A alma, ao contemplar uma soberania tão sagrada, universal, e santa, esboça um doce sorriso de deleitosa complacência, e sente-se segura, e repousa em perfeita paz, rodeada e suportada pelos braços eternos.

4. Muitos mantêm as mais desastrosas concepções sobre a divina soberania. Eles manifestamente a concebem como que procedendo de modo totalmente independente da lei, e de causas ou meios secundários. Sempre ouve-se destas pessoas uma linguagem que implica nestes pensamentos. Eles dizem, "Se esta é a vontade de Deus, não é possível impedi-la. Se Deus começou esta obra, Ele a concluirá". De fato, a linguagem destas pessoas não significa nada, a não ser que estão assumindo que na dispensação da graça tudo é milagre. Eles freqüentemente representam as coisas como manifestamente vindas de Deus, ou como providenciais, porque foram ou aparentaram ser extremamente desligadas dos meios e instrumentos. Em outras palavras, tudo é praticamente miraculoso.

Agora, suponho que a soberania de Deus se manifeste através e por meio, ou de causas secundárias, ou de instrumentos apropriados. Deus é tanto soberano no reino da natureza como em termos de graça. Suponhamos o caso em que fazendeiros, mecânicos, e comerciantes adotassem, na prática, esta visão absurda quanto à soberania divina de que estou falando: Como é que seriam bem sucedidos, por exemplo, nas atividades de plantação agrícola, ou fazendo negócios, se adotassem a postura que estes cristãos e ministérios que acabamos de descrever adotam? Estes que aplicam as suas visões de soberania aos assuntos espirituais, e ao assunto da salvação das almas?

 

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